A Oxigenação por Membrana Extracorpórea, mais conhecida pela sigla ECMO (em inglês, Extra Corporeal Membrane Oxygenation) se trata de um equipamento de alta complexidade que realiza as funções do pulmão e coração, de maneira artificial, através de uma membrana fora do corpo.
O procedimento, realizado em pacientes que possuem os pulmões e coração comprometidos, simplifica os sistemas de circulação extracorporal, substituindo parcial ou totalmente a função respiratória e/ou circulatória, e permitindo que esses órgãos repousem enquanto a cura acontece.
Atualmente, o assunto está entre os mais pesquisados na internet e tem sido alvo de destaque na grande mídia, após a técnica ser aplicada no ator e comediante Paulo Gustavo, em decorrência das complicações causadas pelo novo coronavírus.
Ele está internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital particular do Rio de Janeiro, desde 13 de março. No dia 21, do mesmo mês, o ator foi intubado, devido ao alto grau de comprometimento de seu sistema respiratório, que apresentava os pulmões inflamados.
Durante esse processo, entretanto, ele teve o pulmão ainda mais agravado por uma bactéria, levando a um quadro de infecção. Com a intenção de deixar o pulmão do ator descansar e se recuperar, a equipe médica optou pelo tratamento da ECMO, no dia 2 de abril, chamando a atenção do grande público para a terapia.
A técnica vem sendo cada vez mais utilizada como opção de tratamento para os indivíduos afetados de maneira mais grave pelo vírus da Sars-CoV-2, popularmente conhecido como COVID-19.
Isso porque, na maioria dos casos, o vírus afeta principalmente os pulmões. Nesse caso, o órgão não consegue realizar a troca básica com a ventilação tradicional, passando a apresentar dificuldade para oxigenar o sangue, devido às lesões causadas pela doença.
É nesse instante que a ECMO entra, para ajudar no processo da respiração, limpando o gás carbônico do sangue e devolvendo a oxigenação para os pulmões e coração.
Como funciona o tratamento com ECMO
Foto: Reprodução / Scielo
Segundo o Relatório de Recomendação divulgado pelo Ministério da Saúde, o procedimento da ECMO é utilizado somente em casos mais graves da COVID-19, quando a ventilação mecânica convencional da UTI não consegue mais suprir a demanda de oxigênio dos pulmões.
Nessa situação comprometedora, o paciente passa a utilizar a ECMO, até que os pulmões recuperem-se e readquiram a sua função básica. Para tanto, o paciente precisa estar primeiramente sedado. Depois, são inseridos canos de plástico dentro das veias da perna e do pescoço do paciente.
A máquina, composta por tubos, bomba e aquecedor, aspira o sangue da perna do paciente para o aparelho. Dentro do equipamento, o gás carbônico é eliminado e o sangue é oxigenado, para só então ser devolvido através da veia do pescoço, dando o suprimento que os pulmões não conseguem mais fornecer sozinhos.
O equipamento é constituído por uma série de tubos de plásticos integrados, por onde o sangue flui bombeado por uma bomba eletromagnética, através de uma membrana respiratória. Quando o paciente entra na máquina, o pulmão passa a ser essa membrana artificial, fora do corpo.
O gás carbônico e o oxigênio são controlados por essa membrana, deixando o pulmão real descansar e desinflamar durante o período de tratamento. O paciente pode ficar semanas nessa condição, dependendo do nível de melhora ou piora apresentada. Quando o doente finalmente se recupera é, então, retirado do aparelho.
É importante ressaltar que o procedimento só é valido e utilizado em quadros onde há perspectiva de regeneração do pulmão. Em casos onde o órgão se apresenta bastante debilitado, com muito tempo de UTI, a técnica se torna ineficaz.
Embora seja difícil estabelecer um prazo concreto e uma porcentagem de melhora na utilização da ECMO, especialistas consideram, em média, de 10 a 12 dias para observar uma evolução no quadro de pacientes com COVID-19.
Entretanto, há relatos de pacientes que ficaram mais de três meses utilizando o mecanismo. Os resultados positivos da terapia dependem de variantes pessoais, como idade, genética e comorbidades apresentadas pelo doente.
Indicações e barreiras da ECMO
Atualmente, a ECMO é indicada como uma opção de suporte de vida, que permite ganhar tempo para a recuperação de doentes graves, em falência respiratória e/ou cardíaca, sendo uma importante ferramenta de auxílio médico para situações graves.
Apesar de a técnica estar liberada para pessoas de todas as idades, desde recém-nascidos até idosos, o tratamento da ECMO não é habitual.
Isso porque o procedimento exige a realização de um profissional experiente, que já domina a técnica, além de uma equipe de monitoramento, que precisa acompanhar a terapia e a eficiência da máquina 24 horas.
Outro fator relevante a ser levado em consideração é que a ECMO apresenta grandes riscos de trombose e sangramento, sendo utilizada como segunda e até terceira linha de tratamento, quando outras terapias já não mostram um resultado significativo.
Ademais, o custo da ECMO é considerado alto e muitos planos de saúde não realizam a cobertura do mecanismo. O preço médio de instalação e manutenção da terapia gira em torno de R$ 25 mil a R$ 35 mil, sendo que a parte mais cara é a membrana que realiza o trabalho no sangue, que é 100% importada.
A realidade é que muitos pacientes não têm a chance de serem tratados com uma estrutura como a do ator Paulo Gustavo. O tratamento não é feito em alta escala pelo Sistema Único de Saúde (SUS), ainda mais na escala vertiginosa que a pandemia afeta o Brasil.
A ECMO foi barrada pelo Sistema Único de Saúde em 2015. Nesse ano, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) não autorizou o uso da ECMO no sistema público de saúde, devido ao alto custo do procedimento.
Mesmo levando em conta os resultados positivos de pesquisas que mostram a eficácia do tratamento, o Conitec ponderou que o seu uso dependia da construção de centros especializados e um alto grau de investimento ainda inexistente.
No Brasil, o SUS oferece o tratamento da ECMO principalmente em cirurgias cardíacas, como ponte de safena ou troca de válvula, em unidades especializadas, como o Instituto do Coração e o Instituto do Câncer.
Porém, a máquina também é utilizada para o tratamento de pneumonias graves, podendo salvar inúmeras vidas. A taxa de sobrevivência para quem usa o tratamento é de 60% nos melhores serviços do mundo, ou seja, onde a terapia já é usada rotineiramente.
Em centros não especializados, porém, a taxa cai para 20% a 30% de chance de sobrevivência. Isso quando não faltam materiais de base, como os tubos de plástico.
Riscos e benefícios de tratamento com ECMO
Como todo tratamento invasivo, a terapia da ECMO apresenta riscos e efeitos colaterais que devem ser levados em consideração pela equipe médica, de acordo com as possibilidades de cura e condições físicas, bem como as variantes da idade e outras doenças já conhecidas, segundo o histórico de cada paciente.
Diante disso, é preciso ponderar se os benefícios são maiores que os riscos:
Benefícios
- Equilibrar a circulação de maneira rápida e eficaz;
- Manter o coração e pulmão funcionando enquanto o paciente é tratado pela doença que o levou ao uso da ECMO;
- Tempo de descanso e recuperação dos órgãos comprometidos;
- Possibilidade de realizar hemodiálise ou outros procedimentos cirúrgicos paralelamente ao uso da máquina.
Riscos
- Hemorragias (podem ocorrer porque o sangue deve ser mantido anticoagulado, para evitar bloqueios na tubulação);
- Infecções (como todo procedimento que utiliza tubos no corpo, especialmente dentro de um vaso sanguíneo, quadros de infecções são comuns);
- Embolia e Trombose (pequenos coágulos ou bolhas de ar podem entrar no sangue pelos tubos);
- AVC – Acidente Vascular Cerebral (como a ECMO utiliza a artéria carótida, que usa o vaso sanguíneo veno-arterial, — responsável por levar o sangue para o cérebro — há possibilidade de obstrução durante e após o procedimento).
Diferenças entre ECMO e Ventilação Mecânica
Apesar de semelhantes, a ventilação mecânica não é igual a ECMO. O ventilador também promove as trocas gasosas, dá pressão para o pulmão se manter aberto e fornece oxigênio ao paciente, mas não substitui o pulmão, da mesma maneira que a ECMO, que exige uma técnica muito mais avançada e complexa que um respirador.
A ventilação mecânica favorece a fisioterapia e a recuperação do pulmão, fornecendo um fluxo de ar para o interior deles, porém o suporte da técnica é limitado e depende do órgão para funcionar.
Já a ECMO funciona como um pulmão adicional para pacientes com função pulmonar muito reduzida, possibilitando que o paciente tenha tempo e condição clínica para se recuperar.
Quando o ventilador não consegue mais ajudar o pulmão a realizar as trocas gasosas, a ECMO se apresenta como possibilidade, passando a controlar a troca dos gases (gás carbônico e oxigênio) através da máquina.
A recomendação da ECMO é majoritariamente indicada após a utilização do respirador. Quando o pulmão apresenta uma piora, a ECMO aparece como um suporte adicional na tentativa de salvar a vida do paciente, que já se encontra em um estado muito grave.
Quando então nem a ECMO surte efeito, após algumas semanas, não há muito mais a ser feito. Nesses casos, ainda resta a opção de um tentar um transplante do órgão, o que é considerado muito difícil por existirem outros fatores que podem impedir a realização do procedimento, como infecções ou danos neurológicos.
A intubação do ator Paulo Gustavo e de outros pacientes atacados pela COVID-19 consiste na inserção de um tubo, através do nariz ou boca, até a traqueia do paciente, chamada de ventilação mecânica pulmonar.
Quando a técnica se mostra insuficiente, incapaz de manter o corpo oxigenado, o pulmão precisa, assim, ser temporariamente “substituído” pela ECMO.
O ator Paulo Gustavo, que tem 42 anos, foi considerado pelos médicos como um bom candidato para o tratamento da ECMO, por ser jovem e sem comorbidades.
História e classificações da ECMO
O procedimento da ECMO, utilizada no ator Paulo Gustavo, não é um método novo. A tecnologia é aplicada há mais de 30 anos em unidades de referência especializada, principalmente em situações de complicações decorrentes de cirurgias cardíacas.
Nos últimos anos, o uso da máquina respiratória extracoporal ganhou destaque devido aos estudos que mostraram redução da mortalidade em pacientes com insuficiência respiratória grave.
Durante a pandemia da H1N1, em 2009, o método também ajudou a salvar inúmeras vidas. A aplicação para tratar doentes que não se recuperam com uma internação na UTI convencional é relativamente recente.
A terapia passou a ser utilizada com mais frequência em 2020, justamente para tratar pacientes comprometidos pela COVID-19. No Brasil, o uso da ECMO ainda se mostra bastante restrito.
Existem apenas 21 centros registrados na sociedade internacional Extracorporeal Life Support Organization (Elso), que reúne os locais autorizados e competentes para aplicar a terapia.
O tratamento, que pode substituir o pulmão e/ou coração, depende da condição exigida por cada paciente. A depender da técnica utilizada, a terapia da ECMO pode ser classificada em dois tipos:
- Veno-arterial: utilizada em casos de insuficiência cardíaca. A técnica fornece tanto suporte respiratório como circulatório. O sangue retorna para o sistema arterial, dando suporte hemodinâmico (circulação sanguínea), além do suporte ventilatório.
- Veno-venosa: utilizada em pacientes com insuficiência respiratória. Nessa situação, o sangue é sugado por uma veia central, passando pela membrana extracorpórea da máquina, onde é realizada a troca gasosa e bombeado de volta por uma veia central.