Com a recente morte do Papa Francisco, os olhos do mundo se voltaram novamente para o Vaticano; e, com isso, muitas dúvidas sobre o funcionamento da Igreja Católica vieram à tona.
Uma das perguntas mais comuns que surgem nesse momento é sempre a mesma: por que o papa muda de nome ao ser eleito?
A tradição, repleta de simbolismos e significados históricos, vai muito além de uma simples troca de identidade. Afinal, escolher um novo nome é um dos primeiros atos de um papa recém-eleito.
Esse gesto, que remonta a séculos de história da Igreja, está muito associado ao renascimento espiritual, indicando detalhes interessantes sobre tudo aquilo que o novo pontífice pretende seguir durante seu papado.
Mas como essa tradição começou? E o que ela revela sobre cada papa? É o que explicamos a seguir.
Por que o papa muda de nome quando é eleito?
Assim que o sucessor de São Pedro é escolhido em conclave, os sinos do Vaticano tocam, a fumaça branca sobe e o mundo inteiro aguarda pela frase: Habemus Papam! (“Temos um Papa!”).
E, junto com o anúncio, vem sempre a novidade: o nome que o novo pontífice escolheu para si.
Esse nome, diferente daquele com o qual nasceu, é mais do que simbólico. Trata-se de um gesto carregado de intenção, sinalizando ao mundo qual será o tom, a inspiração e até mesmo os desafios que pretende enfrentar durante seu pontificado.
Assim, ao adotar um novo nome, o papa renuncia à identidade anterior, assumindo inteiramente o papel de líder espiritual da Igreja Católica.
De onde vem essa tradição?
Curiosamente, a prática não começou com os primeiros papas. Nos séculos iniciais do cristianismo, os pontífices mantinham seus nomes de batismo.
Foi somente no ano 533, com a ascensão do papa João II (nascido Mercúrio), que essa tradição ganhou força.
Ele evitou usar o nome de um deus pagão ao assumir o trono de Pedro — uma decisão que, ainda que pontual, acabou se tornando norma com o passar dos anos.
Desde então, mudar de nome passou a ser uma escolha natural, quase obrigatória, refletindo uma ruptura entre a vida anterior do eleito e sua nova missão sagrada.
A escolha carrega também um profundo valor espiritual, como uma “segunda conversão” — um novo nascimento em serviço da fé.
Um espelho do passado e um farol para o futuro
Muitos papas escolhem nomes que prestam homenagem a antecessores que admiram ou a santos cuja trajetória desejam seguir.
Esse, por exemplo, foi o caso de Francisco, que optou por esse nome inspirado em São Francisco de Assis, um símbolo de humildade, simplicidade e cuidado com os pobres.
Ao adotar esse nome, Jorge Mario Bergoglio, título de batismo do último papa, indicava logo de início que seu papado teria como eixo a justiça social, a empatia e a reforma da Igreja.
João Paulo II fez uma homenagem dupla: a João XXIII, responsável pelo Concílio Vaticano II, e Paulo VI, que concluiu esse marco de modernização da Igreja.
Bento XVI, por sua vez, escolheu esse nome em alusão a São Bento de Núrsia, patrono da Europa e defensor dos valores cristãos em tempos turbulentos.
A escolha do nome, portanto, também comunica: ela mostra ao mundo qual legado será seguido, qual visão teológica será fortalecida e que prioridades estarão em foco durante aquele governo pontifício.
Uma tradição que olha para o céu
Por mais curioso que pareça, a escolha do Papa João II de evitar um nome com origem pagã e cósmica não marcou um rompimento definitivo entre o Vaticano e os astros.
Na verdade, ao longo dos séculos, a Igreja Católica desenvolveu uma relação sólida com a astronomia, reconhecendo seu valor científico e espiritual.
Um dos marcos mais evidentes dessa conexão foi o pontificado de Gregório XIII, que reformulou o calendário ocidental com base em cálculos astronômicos.
O resultado foi o calendário gregoriano, adotado até hoje no mundo todo, que corrigiu discrepâncias com os ciclos solares e fez com que dez dias simplesmente desaparecessem do mês de outubro de 1582.
Mais adiante, a Igreja também reforçaria seu compromisso com a ciência celeste com a criação da Specola Vaticana, ou Observatório do Vaticano, ainda em atividade desde o século XIX.
A instituição, administrada por astrônomos jesuítas, contribuiu com mapeamentos estelares, catalogação de corpos celestes e até nomeação de asteroides em homenagem a freiras e religiosos envolvidos em seus projetos.
Se a troca de nome representa uma nova identidade espiritual, essa conexão com os céus reforça que, para o Vaticano, fé e ciência podem, sim, caminhar sob a mesma constelação.