Localizado a mais de 5 mil quilômetros abaixo da superfície, o núcleo da Terra permanece um dos maiores mistérios da geofísica. Com temperaturas e pressões comparáveis às do Sol, essa região inalcançável nunca foi visitada pelo ser humano.
Apesar disso, avanços tecnológicos e estudos sísmicos permitiram que os cientistas desvendassem parte de sua dinâmica.
O núcleo, composto por uma esfera sólida envolta por uma camada líquida, atua na manutenção do campo magnético terrestre e na influência de fenômenos geológicos, como terremotos.
Embora ainda haja muito a ser explorado, pesquisas recentes reacenderam debates, como a suposta interrupção de seu movimento em 2009.
O núcleo da Terra ‘parou’ de girar em 2009?
Em 2023, um estudo da Universidade de Pequim chamou a atenção ao sugerir que o núcleo interno terrestre teria reduzido sua velocidade de rotação por volta de 2009, igualando-se à do restante do planeta.
A mídia interpretou o fenômeno como uma “parada” ou até um giro “invertido”, mas essa simplificação não reflete a complexidade do processo.
Na realidade, o núcleo não parou de girar: o que ocorreu foi uma sincronização temporária entre sua rotação e a do manto terrestre, interrompendo um movimento diferencial que normalmente o faz girar mais rápido que a superfície.
Segundo os pesquisadores Yi Yang e Xiaodong Song, essa sincronização faz parte de um ciclo de aproximadamente sete décadas. Nesse período, o núcleo interno alterna entre aceleração e desaceleração, podendo, em certos momentos, girar em ritmo mais lento que o planeta.
Ou seja, o evento de 2009 não foi uma anomalia, mas sim uma fase previsível de um padrão cíclico. Registros históricos sugerem que fenômenos semelhantes ocorreram nas décadas de 1970 e 1940, reforçando a ideia de que se trata de um comportamento natural.
Como o núcleo da Terra é estudado pelos cientistas?
A impossibilidade de acessar o núcleo interno obriga os cientistas a depender de métodos indiretos. A principal ferramenta é a análise das ondas sísmicas.
Essas vibrações geradas por abalos subterrâneos atravessam o planeta e, ao interagir com o núcleo, sofrem alterações em velocidade e trajetória. Analisando esses desvios, os pesquisadores inferem propriedades como densidade, composição e movimento.
Mudança na rotação e deformações no formato
No ano passado, uma pesquisa da Universidade do Sul da Califórnia (EUA) usou dados de mais de 120 terremotos repetidos em uma mesma região ao longo de 30 anos para confirmar a desaceleração do núcleo a partir de 2010.
John Vidale, geofísico da USC, detalhou como a comparação de ondas sísmicas de eventos nas Ilhas Sandwich do Sul — registradas antes e depois de 2010 — revelou padrões intrigantes.
Ondas que atravessaram o núcleo apresentaram consistência, enquanto as que o “rasparam” mostraram variações. Isso sugere não só mudanças na rotação, mas também deformações temporárias em seu formato.
A hipótese é que anomalias de densidade no manto ou fluxos convectivos no núcleo externo possam distorcer sua estrutura, embora mais estudos sejam necessários para confirmar as causas.